Após um feriado de 7 de setembro tenso no Brasil, com manifestações de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e contra o Supremo Tribunal Federal (STF), além de falas do próprio presidente em ataque a outros poderes nacionais, o Índice Bovespa fechou em queda no fim da tarde de ontem, 8 de setembro.
E não foi qualquer queda. Somando o desempenho do índice ao longo do dia, foram 3,8% a menos, chegando aos 113 mil pontos. Desde março de 2021, quando uma nova grande onda de Covid-19 teve início, que o Ibovespa não operava tão baixo. O dólar, por outro lado, como é normal nesses casos, disparou para R$ 5,32.
Esse resultado é reflexo da instabilidade econômica e política que vive o país. E tanto investidores brasileiros quanto estrangeiros estão inseguros quanto ao que fazer nesse momento. Infelizmente, porém, as quedas na bolsa podem não parar por aí. Na verdade, frente aos últimos acontecimentos, novas quedas podem seguir acontecendo nessa semana.
Últimos acontecimentos e expectativas para o dia
Ao longo do dia de ontem e principalmente no fim da tarde e início da noite, milhares de caminhoneiros se organizaram para dar início a uma paralisação da categoria em todo o país, fechando estradas e impedindo a passagem de outros veículos, de forma muito semelhante ao que já havia acontecido em 2018, ainda que com reivindicações diferentes.
O objetivo seria apoiar o presidente e manifestar-se à favor do voto impresso e contra o STF. Alguns grupos chegaram a reivindicar o fim do órgão do judiciário, afirmando que as rodovias só seriam liberadas caso os ministros deixassem seus cargos ou fossem depostos. Com essa motivação, a Esplanada dos Ministérios chegou a ser ocupada ao longo do dia e houve tentativa de invasão em alguns ministérios.
Nesse clima, em diversas cidades do país a população correu para os supermercados e postos de combustível a fim de garantir alimentos e o abastecimento de veículos, com receio de uma falta, caso a paralisação perdure por muito tempo.
Porém, também na noite de ontem, um áudio gravado pelo presidente Bolsonaro mudou um pouco o cenário. Na gravação, o governante destacou que os bloqueios atrapalham a economia e pedia que as rodovias fossem liberadas. Veja abaixo:
"Fala para os caminhoneiros aí, que são nossos aliados, mas esses bloqueios atrapalham a nossa economia. Isso provoca desabastecimento, inflação e prejudica todo mundo, em especial, os mais pobres. Então, dá um toque no caras aí, se for possível, para liberar, tá ok? Para a gente seguir a normalidade. Deixa com a gente em Brasília aqui e agora. Mas não é fácil negociar e conversar por aqui com autoridades. Não é fácil. Mas a gente vai fazer a nossa parte aqui e vamos buscar uma solução para isso, tá ok? E aproveita, em meu nome, dá um abraço em todos os caminhoneiros. Valeu"
Diante disso, alguns caminhoneiros optaram por seguir a manifestação, mesmo com o pedido de Bolsonaro, enquanto outros dispersaram. Dentro de muitos grupos, porém, ficou um clima de irritação com o presidente. Alguns líderes da manifestação chegaram a se manifestar em redes sociais, demonstrando que se sentiram ofendidos com o pedido do presidente.
Na manhã dessa quinta-feira, 9 de setembro, o Ministério da Infraestrutura informou a ocorrência de manifestações de caminhoneiros em que 15 estados brasileiros, ou seja, elas seguiam acontecendo e segundo os próprios líderes da categoria, como Wallace Landim, presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores, dentre os manifestantes há bastante polaridade.
Já no início da tarde, porém, a manifestação dava as primeiras amostras de enfraquecimento, com a diminuição dos atos para 14 estados e com bloqueios sendo realizados em cinco deles (BA, MA, MG, MS e SC). Nos estados demais estados onde houve registro de manifestações, elas aconteciam apenas por meio de pontos de concentração de caminhoneiros.
Mas muita coisa ainda pode acontecer ao longo do dia de hoje e dos próximos, e é difícil prever até quando poderão durar as manifestações. O fato é que com toda a insegurança e com a possibilidade de desabastecimento de muitas cidades, especialistas já prevêm novos aumentos na inflação já alta, além de mais insegurança política, o que com certeza deve seguir impactando no Ibovespa.
Bolsonaro se reúne com caminhoneiros
Um fato novo, divulgado na manhã dessa quinta-feira pela agência Reuters, pode ter novos desdobramentos nesse cenário: Bolsonaro deveria se reunir ainda na manhã de hoje, dia 9, com líderes da manifestação dos caminhoneiros na tentativa de encerrar os bloqueios e as paralisações.
A informação teve como base um discurso feito pelo próprio presidente a apoiadores na frente do Palácio da Alvorada na manhã de hoje. Sua fala foi a seguinte: "Eu tenho uma hora na manhã… já tenho o tempo tomado com o pessoal dos Brics, uma hora, mas estou mais cedo também. Nesses dois intervalos vou conversar com os caminhoneiros para a gente tomar uma decisão".
Segundo informações divulgadas pelo site Metrópoles, essa reunião estava acontecendo, de fato, no fim da manhã. Participavam o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, além dos líderes dos manifestantes.
Caminhoneiros disseram que não vão se desmobilizar
Já no fim da tarde dessa quinta-feira, informações divulgadas pelo Portal Extra, da Globo, divulgaram que mesmo após a reunião com o presidente os caminhoneiros não pretendem encerrar as manifestações, até porque segundo um representante do grupo, na reunião, o presidente não pediu que eles cessassem a paralisação.
No início da tarde, após a reunião, os representantes dos caminhoneiros seguiram no saguão no Palácio do Planalto acompanhados de deputados bolsonaristas como Carla Zambelli (PSL-SP), Major Vitor Hugo (PSL-GO) e Bibo Nunes (PSL-RS). A expectativa era de poderem se encontrar com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para quem esperavam entregar um documento.
O teor do documento não foi divulgado, porém, os caminhoneiros negam que a alta do preço dos combustíveis seja um dos motivos do protesto. "Não temos nada com relação a preço de combustível nesse momento. Estamos mobilizados pelos direitos de liberdade, de expressão, de manifestação. O povo está sendo impedido de se posicionar em muitas questões e precisamos que isso mude, que a Constituição seja respeitada de forma integral", disse um dos presentes, Francisco Dalmora Burgardt, o Chicão Caminhoneiro, ao portal Extra.
Nota oficial é divulgada após encontro com o ex-presidente Michel Temer
No meio da tarde veio a público também a informação de que o presidente Jair Bolsonaro havia se encontrado com o ex-presidente Michel Temer, numa reunião que teria durado cerca de 4 horas. Segundo informações divulgadas por um assessor de Temer, o ex-presidente estaria intermediando a pacificação entre os poderes, já que possui boa relação com Bolsonaro e também com Alexandre de Moraes.
Por volta das 16h25 uma nota oficial foi divulgada pelo Governo Federal em nome de Bolsonaro. Veja a nota na íntegra:
Declaração à Nação
No instante em que o país se encontra dividido entre instituições é meu dever, como Presidente da República, vir a público para dizer:
1. Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar.
2. Sei que boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de entendimento acerca das decisões adotadas pelo Ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news.
3. Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de "esticar a corda", a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia.
4. Por isso quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum.
5. Em que pesem suas qualidades como jurista e professor, existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes.
6. Sendo assim, essas questões devem ser resolvidas por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto no Art 5º da Constituição Federal.
7. Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país.
8. Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição.
9. Sempre estive disposto a manter diálogo permanente com os demais Poderes pela manutenção da harmonia e independência entre eles.
10. Finalmente, quero registrar e agradecer o extraordinário apoio do povo brasileiro, com quem alinho meus princípios e valores, e conduzo os destinos do nosso Brasil.
DEUS, PÁTRIA, FAMÍLIA
Jair Bolsonaro
Presidente da República federativa do Brasil
Divulgação do IPCA impacta também
Outro fato que teve impacto sobre o mercado de ações foi a divulgação do Índice de Preços aos Consumidor Amplo (IPCA) de agosto. A pesquisa publicada hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que a inflação de agosto ficou em 0,87% (bem próximo ao que apontava a prévia de 0,89%) e que no acumulado do ano, ela já tem um aumento de 5,67%. Além disso, em 12 meses já são quase 10% de alta nos preços.
A inflação alta vem sendo causada por uma série de fatores, mas vem contribuindo muito para isso o preço dos combustíveis e da energia elétrica. Os alimentos, também estão mais caros.
O Banco Central, por meio do Comitê de Política Monetária (COPOM), vem fazendo tentativas de controle da inflação desde o inpicio do ano, por meio de aumentos gradativos na taxa básica de juros do país, a Taxa Selic, que atualmente está em 5,25%. Porém, apesar dos esforços, há um visível desequilíbrio, mais uma vez demonstrado pela pesquisa, que também deve contribuir para incertezas e para a debandada de muitos investidores.
Uma nova reunião do Copom está marcada para daqui duas semanas, quando novos aumentos deverão acontecer.
Ibovespa vai a 116 mil pontos depois de dia de queda
Na abertura do mercado, às 10 horas dessa quinta-feira, a cotação do Ibovespa estava em 113.587,62, o que representa uma alta de 1,15% em relação à precificação no fim do dia de ontem.
Porém logo no início da tarde, a situação se reverteu e o Ibovespa voltou a cair. Por volta das 12h48 já estava em 112.747 pontos, numa redução de 0,59%.
Um pouco mais tarde, por volta das 14 horas, novamente o índice voltou a casa dos 113 mil pontos, mas mostrando uma significativa oscilação, por volta das 14h40 já havia voltado aos 112 mil pontos.
Porém, no fim da tarde, após a divulgação da nota oficial do presidente Bolsonaro, o Ibovespa deu um salto, ficando em 116.146 até por volta das 16h50.
Declarações dos Três Poderes
Ao longo da terça-feira, dia 7, e dessa quarta-feira, dia 8, o presidente Jair Bolsonaro fez diversas declarações atacando principalmente o STF. Durante as manifestações de terça, ele chegou a dizer, inclusive, que não mais iria cumprir com as decisões do Ministro Alexandre de Moraes.
Em resposta a essas falas, o presidente da corte, ministro Luiz Fux fez um discurso ontem, destacando a importância da discordância e da fiscalização dos poderes por parte da sociedade, como parte da democracia, mas lembrando que não é isso que vem acontecendo nos ataques feitos ao STF. "Infelizmente, tem sido cada vez mais comum que alguns movimentos invoquem a democracia como pretexto para a promoção de ideais antidemocráticos", disse Fux.
Veja mais um trecho abaixo:
"Nós, Ministras e Ministros do STF, sabemos que nenhuma nação constrói a sua identidade sem dissenso. A convivência entre visões diferentes sobre o mesmo mundo é pressuposto da democracia, que não sobrevive sem debates sobre o desempenho dos seus governos e de suas instituições.
Nesse contexto, em toda a sua trajetória nesses 130 anos de vida republicana, o Supremo Tribunal Federal jamais se negou - e jamais se negará - ao aprimoramento institucional em prol do nosso amado país.
No entanto, a crítica institucional não se confunde - e nem se adequa - com narrativas de descredibilização do Supremo Tribunal e de seus membros, tal como vem sendo gravemente difundidas pelo Chefe da Nação.
Ofender a honra dos Ministros, incitar a população a propagar discursos de ódio contra a instituição do Supremo Tribunal Federal e incentivar o descumprimento de decisões judiciais são práticas antidemocráticas, ilícitas e intoleráveis, em respeito ao juramento constitucional que fizemos ao assumirmos uma cadeira na Corte.
Infelizmente, tem sido cada vez mais comum que alguns movimentos invoquem a democracia como pretexto para a promoção de ideais antidemocráticos. Estejamos atentos a esses falsos profetas do patriotismo, que ignoram que democracias verdadeiras não admitem que se coloque o povo contra o povo, ou o povo contra as suas instituições.
Todos sabemos que quem promove o discurso do "nós contra eles" não propaga democracia, mas a política do caos. Em verdade, a democracia é o discurso do "um por todos e todos por um, respeitadas as nossas diferenças e complexidades".
Povo brasileiro, não caia na tentação das narrativas fáceis e messiânicas, que criam falsos inimigos da nação. Mais do que nunca, o nosso tempo requer respeito aos poderes constituídos. O verdadeiro patriota não fecha os olhos para os problemas reais e urgentes do país. Pelo contrário, procura enfrentá-los, tal como um incansável artesão, tecendo consensos mínimos entre os grupos que naturalmente pensam diferentes. Só assim é possível pacificar e revigorar uma nação inteira"
Na noite de ontem o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) também se manifestou destacando que o Poder Legislativo seguirá atuando com transparência e em prol da população e que assuntos que já foram colocados em pauta e votados, como é o caso do voto impresso, estão encerrados e que não serão toleradas questionamentos sobre "decisões tomadas e superadas". Em nenhum momento de seu discurso ele falou sobre a possibilidade de Impeachment.
Veja abaixo na íntegra o vídeo do deputado:
Outro que se manifestou na noite de ontem foi o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Segundo ele, o país vem, sim, enfrentando problemas sérios, mas a solução não está em arroubos antidemocráticos, mas no diálogo, entendimento e respeito entre os Poderes.
Ele procurou lembrar que todos os brasileiros vivem em um país em "crise real de fome e miséria", com aumento da inflação, diminuição do poder de compra, desemprego, crise energética e crise hídrica, além da pandemia. Sua fala na íntegra pode ser conferida abaixo:
Momento é delicado
Para especialistas, o Brasil vive um momento muito delicado pois muitos dos caminhos possíveis levariam a uma instabilidade política e econômica ainda maior. Se, por um lado, a permanência do presidente Bolsonaro, com as falas e ameaças que ele faz, gera uma situação de medo interna e externamente, por outro lado, um Impeachment também poderia resultar em instabilidade.
Além disso, as próprias manifestações tiveram efeitos esperados e inesperados. Porque de um lado, a força que o presidente esperava manifestar com as convocações que fez, ficou abaixo do esperado, mesmo entre as categorias que conversam de forma mais próxima com seu governo como os evangélicos, ruralistas, caminhoneiros e polícias. Se isso é bom, por um lado, por outro também tira um pouco das expectativas. Porém, se as manifestações tivessem resultado na força que era esperada, isso com certeza teria reflexos na política e na economia também.
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